Exames laboratoriais: necessidade ou desperdício?

Exames laboratoriais: necessidade ou desperdício?

Para médicos, pacientes e seus familiares, um dos momentos mais delicados da assistência à saúde é o da definição diagnóstica. Um diagnóstico correto é o primeiro passo para se definir o tratamento apropriado. Bernard Lown, médico professor emérito da Harvard School of Public Health, que desenvolveu o desfibrilador cardíaco, e Prêmio Nobel da Paz (1985), em 1999 afirmou que a história clínica, em 75% das consultas, fornece informações suficientes para o diagnóstico, mesmo antes da realização do exame físico e da solicitação de exames complementares.

Entretanto, segundo o relatório “Melhorando o Diagnóstico na Assistência à Saúde” (Improving Diagnosis in Health Care), publicado pelo Instituto de Medicina norte-americano em 2015, o erro diagnóstico ainda representa um aspecto crítico da assistência à saúde. Segundo essa publicação, adultos norte-americanos serão vítimas de, ao menos, um erro diagnóstico ao longo de sua vida, algumas vezes com consequências devastadoras e 5% de adultos que buscam assistência ambulatorial experimentarão um erro diagnóstico, a metade com possibilidade de danos. Nos últimos anos o número de queixas por erros diagnósticos contra o sistema de saúde do Reino Unido cresceu 22%. É sabido que diagnósticos tardios de doenças aumentam o risco de disseminação e levam a complicações, tornando o tratamento mais difícil. Médicos que trabalham em condições de pressão podem perder preciosas informações durante a coleta de dados clínicos mas, hoje, já podem dispor de modernos exames complementares que auxiliam na rápida definição de diagnósticos, prognósticos e até tratamentos.

Por isso deve ser saudada a recente publicação da primeira edição da lista de exames laboratoriais essenciais, pela Organização Mundial da Saúde (OMS), onde estão destacados os exames necessários para endereçar prioridades em saúde. A lista, que teve como base diretrizes baseadas em evidências científicas, contém exames que devem estar disponíveis em ambientes de assistência primária à saúde, hospitais e em laboratórios de referência.

Os gastos com exames laboratoriais representam apenas de 1,4% (Alemanha) e 2,3% (Estados Unidos) dos gastos totais do sistema de saúde e estima-se que o laboratório clínico contribua com cerca de 70% das informações utilizadas pelos médicos em suas decisões. Meta-análise realizada ao longo de 15 anos revelou maior prevalência de subutilização (44,8%) do que a superutilização (20%) de exames laboratoriais. Mais que se preocupar com o volume, portanto, deve-se avaliar o valor e os benefícios trazidos pelos exames laboratoriais.

No momento atual em que diferentes exames laboratoriais já são oferecidos livremente em várias redes de farmácias brasileiras, sem a devida regulação, cabe considerar o alerta da OMS em relação a realização de exames: “isoladamente eles não trarão os impactos desejados, sendo necessário que o laboratório clínico que os realiza seja dotado de infraestrutura suficiente, mostre-se integrado, conectado, tenha recursos humanos treinados e capacitados e sistemas de garantia de qualidade implantados”. No Brasil, o programa de acreditação de laboratórios clínicos (PALC), lançado pela Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial em 1998 e já reconhecido pela Agência Nacional de Saúde (ANS), há anos já avalia a qualidade oferecida pelos laboratórios clínicos brasileiros, contribuindo para assegurar a confiabilidade dos seus resultados e a segurança dos pacientes.

A OMS pretende atualizar a lista anualmente, e a próxima edição incluirá exames relacionados à resistência microbiana, surtos/emergências, doenças emergentes, negligenciadas e sepse. Nas palavras do Dr. Tedros Ghebreyesus, diretor da OMS, “ninguém deve sofrer ou morrer por causa da falta de serviços diagnósticos ou por não ter acesso aos exames mais indicados”.

Dr. Wilson Shcolnik
Presidente da Soc. Brasil. de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial

Fonte: http://www.bibliotecasbpc.org.br

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